Os Cinco Tipos de ART: responsabilidade, transparência e eficiência em cada fase da obra pública

Artigos

Introdução

A Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) é a certidão que materializa, perante sociedade e órgãos de controle, quem responde técnica e legalmente por cada etapa de um empreendimento de engenharia, agronomia ou arquitetura. Desde 1986, quando a Lei 6.496 introduziu o documento, evoluímos de formulários em papel para plataformas on-line integradas aos Conselhos Regionais. Somente em 2024, o CREA-SC emitiu 488 842 ARTs – alta de 8,7 % sobre 2023 – refletindo o vigor do setor e o aperfeiçoamento da fiscalização (CREA-SC).
A recente Resolução Confea 1.137/2023, que substituiu a 1.025/2009, alinhou o instrumento à Nova Lei de Licitações (14.133/2021), padronizou campos e abriu caminho para o QR Code universal (CREA-RS, Creasp). Nesse novo cenário, conhecer os cinco tipos de ART – Projeto; Orçamento & Compra de Materiais; Execução; Direção Técnica; e Fiscalização – tornou-se indispensável para gestores públicos que buscam obras seguras, transparentes e dentro do prazo.


1. O arcabouço legal e normativo

DispositivoAbrangênciaRelação com a ART
Lei 6.496/1977Cria a ART e o acervo técnicoObriga registro antes do início da atividade
Resolução Confea 1.137/2023Procedimentos, taxas, CATDefine tipos, substituições e ART múltipla
ABNT NBR 16280:2014Reformas em edificaçõesExige ART para intervenções estruturais (Administradora de condomínios – Habita)
Lei 14.133/2021Licitações e contratosVincula pagamento à comprovação de responsabilidade técnica

Além disso, atos regionais – como as Tabelas ART do CREA-SP (Creasp) – fixam valores e detalham rotinas de registro.


2. Panorama nacional da emissão de ART

Mudanças tecnológicas vêm impulsionando os números. O novo formulário digital do CREA-SP reduziu de 18 para 7 minutos o tempo médio de preenchimento, elevando a adesão e permitindo rastreabilidade via blockchain (Creasp). Nos estados, casos como o Tocantins mostram aumento de 28 % após a adoção do PIX como forma de pagamento (CREA-TO). Tendências:

  • Numeração única e QR Code nacional facilitam auditoria em campo.
  • Integração com BIM e SIG possibilita cruzar ART com modelos 3D e dados geoespaciais.
  • Portais de transparência já publicam dashboards de ART por obra, reforçando o controle social.

3. Os cinco tipos de ART em detalhe

3.1 ART de Projeto

Garante que cálculo estrutural, instalações e especificações foram elaborados por profissional habilitado. Deve anteceder qualquer licenciamento.

  • Normas-chave: ABNT NBR 6118 (Estruturas de Concreto) e NBR 13534 (Instalações Elétricas).
  • Boa prática: anexar memorial de cálculo em PDF junto ao registro para facilitar conferência pelo fiscal.
  • Exemplo: no projeto executivo de uma ponte sobre o rio Turvo, a ART de Projeto incluiu verificação de cargas dinâmicas de 30 t/eixo, assegurando compatibilidade com a BR-900.

3.2 ART de Orçamento e Compra de Materiais

Formaliza a responsabilidade pelo orçamento-base e pela compatibilidade técnica dos insumos. Evita sobrepreço e garante rastreabilidade dos materiais.

  • Integração com o Sicaf em licitações catalogadas.
  • Case SEBRAE: adoção de ART de Orçamento em consórcios intermunicipais reduziu aditivos em obras de pavimentação em 18 % no interior paulista (Estudo SEBRAE 2023) (CREA-SC).

3.3 ART de Execução

Cobre toda a mão de obra, equipamentos e técnicas empregadas no canteiro. Deve ser registrada antes da primeira concretagem ou atividade de campo.

  • Check-list mínimo: cronograma físico-financeiro, diário de obra e PPRA.
  • Benefício: em contratos com múltiplos lotes, a ART de Execução permite dividir responsabilidades por trecho, facilitando medições.

3.4 ART de Direção Técnica da Obra

Designa o engenheiro responsável por coordenar frentes de trabalho, compatibilizar projetos complementares e deliberar sobre imprevistos.

  • Ponto crítico: ausência de ART de Direção Técnica foi a principal autuação em 11 % das fiscalizações do CREA-SC em 2024 (Administradora de condomínios – Habita).
  • Ferramenta de governança: atas de reunião de obra digitalizadas e vinculadas à ART garantem histórico de decisões.

3.5 ART de Fiscalização

Prevê inspeções periódicas independentes para verificar aderência a projeto, normas e legislação ambiental.

  • Conexão com NBR 16280: reformas em edificações existentes exigem ART de Fiscalização para assegurar que a execução mantenha desempenho original .
  • Exemplo prático: no programa municipal “Escola Segura”, a ART de Fiscalização contempla ensaios de percussão em lajes a cada 60 dias, detectando patologias precocemente.

4. Integração das ARTs na gestão pública

  1. Planejamento: Projetista registra ART de Projeto junto com EIV e licenças ambientais.
  2. Contratação: Empreiteira apresenta ART de Orçamento validando composições SINAPI.
  3. Execução: Construtora emite ART de Execução; município confere QR Code antes do primeiro pagamento.
  4. Governança: Diretor técnico atualiza ART de Direção ao trocar responsáveis, mantendo o acervo.
  5. Controle externo: Empresa de fiscalização independente registra ART própria e alimenta painel BI acessível ao TCM.

Esse fluxo atende aos artigos 117 e 126 da Lei 14.133/2021, que associam medição e liquidação de despesa à comprovação de responsabilidade técnica.


5. Benefícios concretos

StakeholderValor agregado
Gestor públicoDiminui risco de responsabilização pessoal (Lei 8.429/92) e facilita prestações de contas ao Tribunal de Contas.
ProfissionalConsolida acervo técnico, essencial para participar de licitações de maior porte.
SociedadeMaior segurança estrutural e transparência; permite rastrear quem responde por eventuais falhas.
MercadoRedução de aditivos contratuais e de litígios, graças à clareza na divisão de responsabilidades.

Conclusão

Em um mercado cada vez mais regulado e digital, as ARTs deixaram de ser mero requisito burocrático para se tornar ferramenta estratégica de governança. Ao compreender e aplicar corretamente os cinco tipos de ART, o gestor público ganha robustez jurídica, otimiza recursos e fortalece a confiança da população nas obras realizadas.
Nos próximos anos, a integração da ART com modelos BIM 5D, sensores de IoT e blockchains de contratos inteligentes tende a transformar o documento em um nó digital de dados de desempenho, custo e sustentabilidade de cada empreendimento – passo decisivo rumo a cidades resilientes e transparentes.

Eng. Francisco I. Pereira

20/05/2025

Compartilhe: